1968 e 1969 – inesquecíveis anos
Os anos de 1968 e 1969 foram marcantes na história da humanidade (tal como está sendo o ano de 2016, diga-se de passagem, sem tocar no mérito de progresso ou retrocesso): o homem pisou na Lua, Festival Woodstock nos EUA, significativas mudanças políticas em diversos países da Europa e AI-5 em pleno vapor na ditatura do Brasil, para citar brevemente alguns exemplos. Esta entrevista com a Alexandre Queiroz revela as impressões de um brasileiro politizado que acabava de voltar de viagem ao exterior.
Folha do Sul, Agosto de 1969
ENTREVISTA COM O Dr. ALEXANDRE MUNIZ DE QUEIROZ
P – Sabedores que o senhor acaba de retornar de uma viagem à Europa, perguntamos quais os países visitados e os fatos políticos que mais o impressionaram?
R – Visitamos Portugal, Espanha, França, Mônaco, Itália, Vaticano, Suíça, Liechtenstein, Áustria, Alemanha, Holanda, Bélgica e Inglaterra.
Os fatos políticos que mais me impressionaram, ou que tive ocasião de assistir durante a nossa permanência na Europa, além da descida da Apollo 11 na Lua – que também é um fato político e dos mais importantes, mormente em se considerando a luta travada entre os Estados Unidos e a Rússia, na qual esta foi fragorosamente derrotada –, foram os seguintes: Primeiro – Eleição de Pompidou para Presidente da França, em substituição ao General De Gaulle, vencendo Poher no segundo escrutínio com grande margem de votos. Foi, sob certos aspectos, uma vitória emocionante, mormente por ser Poher um político novo e hábil, em franca ascendência e no exercício interino da Presidência da República, o que vale dizer, lá como cá, com poderosa máquina governamental em seu poder. Digo isso, porque verifiquei, de perto, que aqui como ali, em política, são os mesmos os métodos usados: de quem mais pode, das retaliações, intrigas, golpes baixos, etc.
Segundo: A reação do País de Gales, Escócia e Irlanda contra a proclamação do Príncipe de Gales, duramente aceito como tal.
Terceiro: A volta da Espanha à Monarquia, com a proclamação pelo General Franco do Príncipe Juan Carlos de Borbón y Borbón, neto do último monarca da Espanha, a Rei. Uma inversão na ordem natural das coisas, mas isso não é a primeira, mas a terceira vez que acontece na Espanha: não a proclamação de um general como rei, mas a proclamação de um rei por um general.
Notei, finalmente, a grande popularidade e estima, pelos portugueses em geral, do dr. Marcelo Caetano como seu Primeiro Ministro.
P – A juventude parisiense aceita o atual presidente da França?
R – Sim, na sua grande maioria, mormente por ter Pompidou prometido (talvez apenas como “bom político”) a reforma universitária por eles desejada. Todavia, como natural, também há, e em grande número, os descontentes e do contra.
P – Como vê o Europeu a América Latina e especialmente o Brasil?
R – Depende do país visitado. Nos latinos (Portugal, Espanha, França e Itália) o Brasil é muito estimado. Mormente na França e Portugal. Neste, principalmente, a impressão que se tem, generalizada, e tal a preocupação que eles têm de nos ser agradáveis, que para os portugueses cada brasileiro é um filho seu!!! Nos outros países é quase simplesmente esquecido… menos Pelé!!
P – Encontrou muitos estudantes brasileiros? Que cursos fazem?
R – Não, apenas alguns poucos, porque eles estavam em férias. E estes poucos mesmos, amigos mais íntimos do meu filho Antônio Diomário, que ali estuda, em Paris.
São diversos os cursos que fazem, e, em geral, bem reconhecidos e remunerados pelo governo francês, sendo de notar que os casados, como ocorre com o Diomário, recebem, mediante módico aluguel, apartamento completamente mobiliado, desde a cama à mesa e à cozinha, etc.
P – Qual a opinião do povo francês a respeito das conversações de paz sobre a guerra do Vietnam?
R – Não tive tempo de ler jornais, nem brasileiros nem estrangeiros. Mas vi a casa, devidamente isolada, e guarnecida em Paris, onde se estava processando a reunião sobre o Vietnam. No começo, como geralmente em tudo, muita agitação e curiosidade; uns dias depois, silêncio e rotina…
P – Em qual país visitado a democracia encontra-se mais aperfeiçoada?
R – Não deu pra verificar; e acho mesmo que Democracia pura já não existe em parte alguma. Por outro lado, precisa saber-se o que é que se entende por democracia. Se for o direito de se dizer livremente o que se pensa, a Inglaterra, onde ainda tivemos ocasião de ver um orador popular dizendo o que queria em pleno Hyde Park, no coração de Londres e perto do Palácio Real. Se for o de se ter a “imprensa livre” ou se reger pelo partido do seu gosto, “cada um dono de si” ou chefe de seu próprio partido, a França. Se for organização, a Holanda; se for estabilidade, a Suíça; se for previdência social, a Bélgica; se for o de viver bem conforme uma vontade superior, bem dirigida, Portugal; se for o de poder gritar quanto possa, a pretexto de tudo e mesmo sem pretexto algum, a Itália!!!
P – Trocaria o Brasil pela França (no sentido de fixar residência)?
R – Em hipótese alguma!!! Nem a França, nem outro qualquer! O Brasil somente não é o país do futuro, como país do presente! E, conforme já disse e concluí entrevista pela Rádio, Joaçaba ainda é a minha cidade preferida!
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